Onde mora o segredo.

"[...] Um lugarzinho no meio do nada

Com sabor de chocolate

E cheiro de terra molhada."

Toquinho

A melhor hora do meu dia são os finais de tarde. É a hora que mais gosto de manter-me viva.

Fico comovida com o vento ritmado de preguiça e o alaranjado do sol se pondo em algum lugar.

Tenho um otimismo gostoso nessa hora do dia.

Acho que é uma hora propícia para cafés, abraços e lembranças.

Tudo é tão bucólico.

Várias sentimentalidades me invadem e é como se o vento me trouxesse boas novas,conversasse intimamente ao meu ouvido e me contasse uma história singela de sonhos e confetes. 

Me percebo inteira nessa hora, sem compartimentalidades, divisas e obrigações.

Imagine fechar os olhos por um instante, sentir um delicado vento gélido e ter em companhia beija-flores sedentos e um estridente coral de cigarras - e mais, tempo para vê-los em atividade, piruando de lá pra cá nos galhos das árvores, sem pressa, cheios de paciência.

Eu se fosse você daria um Nossa! cheio de delírios agora, se é que você parou para imaginar! 

Há algum tempo essa pintura só existia nas minhas quimércias pretensões, mas hoje é real, me faz parte.

Hoje tenho um alpendre, mas antes tinha outras quimeras. É nesse lugar que experiencio meus finais de tarde. Até minhas preocupações, urgências e aparências ficam contrangidas com tanto refrigério.

De camisão surrado e chinelos desbotados fico horas na caixa do nada, como carinhosamente apelidou minha mãe meus vazios. Eu não sei dizer quantos arrepios aquele lugar já me presenteou ou quantas poesias Manoel de Barros já me sussurrou no balançar da rede. Só sinto.

Perco-me, retomo de outros começos,meios e fins e faço uma bagunça geral pra que até o nada não fique em ordem.

Assim, inteira, gosto de contemplar os meus barulhos particulares.