25 de mai. de 2013

Ator do instante*


**O espaço em branco desta folha me convoca a habitar algum lugar. Resisto.  É como se tivesse nada a declamar ou não quisesse fazê-lo.  Logo eu, de tantas palavras, sons e desatinos. Paro um pouco de modo a me concentrar no quero pronunciar. 
(...) Mas não é concentração que desejo. Vou seguindo, deixando as palavras me escreverem, criando rastros do que nem sei que pode vir a ser.  Escrever o que se passa.  Parar.  Um convite que soa como assombração e refrigério. 
Esse papel e eu, uma relação incomum de conexão. Sigo, já não sou a mesma do último suspiro.  Meu corpo não cabe na cadeira que me sustenta, faço flexões, sinto estremecer algo com muita vida dentro de mim. Ossos, fibras, estalos, dedos, sangue, vontade de levantar e escrever um pouco mais como me sinto nesse ato de envolver-me em palavras. Eu ainda resisto, penso na insuficiência do meu corpo, da falta de palavras arranjadas, da conexão racional do que envolve dizer algo a alguém. 
Esse abismo que pulsa, essas gentes que olham, esse corpo que não reage, essa folha que tem que ser escrita. Tudo me atravessa nesse instante. E a próxima palavra, quem vai pronunciar? Estranho escrever sozinha o que logo mais será de uma multidão. Sinto o tempo.
A imagem do tempo é o que está entre nós. Haja tempo para eu me refazer em você, para olhar você, suspirar por você. Quem é você? Zona de tensão entre o que eu penso de mim e o que escrevo. 
Escrever é também andar, mover-se devagarinho adiante, conectar-se com outro passo e outros pés e outros céus. Andar é colocar em funcionamento as articulações, é espreguiçar-se, é sentir o tempo sendo corpo e o outro sendo a gente. 
Tudo tanto. Quero menos.  

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* Título extraído da página do facebook de "Eu me chamo francisco"
**Texto apresentado originalmente na aula de TTP II - Psicologias Humanistas.

2 comentários:

  1. Há tantas intervenções pensadas e guardadas, quando penso em fecundá-las sempre lembro de você.
    Você seria uma ótima companheira para processos artísticos.
    Te multiplica e manda metade de ti pra mim, Thami?

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  2. penso o mesmo de vc.
    quantas artistagens poderíamos fabricar juntas.

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