23 de jul. de 2011

Lembrando da Amy, reluzindo a Macabéa.

E então - então o súbito grito estertorado de uma gaivota, de repente a águia voraz erguendo para os altos ares a ovelha tenra, o macio gato estraçalhando um rato sujo e qualquer, a vida come a vida.
(...) O instante é aquele átomo de tempo em que o pneu do carro correndo em alta velocidade toca no chão e depois não toca mais e depois toca de novo. Etc. , etc., etc. No fundo ela não passara de uma caixinha de música meio desafinada. Eu vos pergunto:
- Qual é o peso da luz?
E agora - agora só me resta acender um cigarro e ir para casa. Meu Deus, só agora me lembrei que a gente morre. Mas - mas eu também?! Não esquecer que por enquanto é tempo de morangos.
Enfim, descobrimos, agora, que tudo começa e acaba com um sim. Também é preciso coragem para morrer, silêncio para ouvir o grito da vida.


Trecho de A hora da estrela,
de Clarice Lispector.

4 comentários:

  1. Linda homenagem, príncipa! Seu talento é admirável e merece reconhecimento.

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  2. esse café é o único que eu tomo e amo, sabias?
    apesar das palavras me soarem familiar (pois ja li "a hora da estrela"), por algum momento pensei que fosse tuas.
    você é tão visceral quanto a clarice.
    tuas palavras me fazem tão bem quanto as dela.
    e quanto a Amy, que ela tenha sossego nessa pós-vida. porque enquanto esteve viva, indubitavelmente, sua alma era tão cheia de conflitos. :/

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  3. Sabe,renata
    Estava escutando Zeca Baleiro ontem e escutei uma música dele que mencionava os atritos ao invés dos contratos.
    Lembrei logo da Amy, da sua estada nesse mundo,
    nas inquietações indubitáveis de sua figura,
    do seu timbre extraórdinário e dos atritos em detrimento dos contratos.
    Logo nesse mundo de contratos sociais, do tempo milimetricamente gasto, da aparência e das glórias ... Ela, sem dúvida, não tolerava mais esse mundo sem as drogas e por isso mesmo sua figura é avessa e cheia de atritos com isso a que chamamos de vida.
    Muitos silêncios ficam como os que ficaram com a partida de Macabéia.
    Mas muitos gemidos se vão, só não nos cabe denominar de quê.

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