por Adriana Lisboa,
Estou desde ontem pensando numa coisa que o meu irmão André me escreveu num e-mail: “Mas como tem gente escrevendo no mundo, não? Uma barulheira sem tamanho.”
As palavras de André, que certamente ele não escreveu medindo seu potencial de gênese ou de apocalipse, me levaram direto, mais uma vez, à pergunta que nunca quis calar: escrever por quê? Por que colocar mais um livro nas livrarias, mais um, por que passar dois anos perseguindo uma história que talvez não tenha relevância no mundo, vê-la editada ou não, resenhada ou não, lida ou não, comentada ou não, premiada ou não, apreciada ou não?
Essa sempre foi, para mim, uma pergunta difícil – quase impossível – de responder. Eu não diria, como o Saramago diz (numa imagem que contudo é bela), que seria o mesmo que perguntar por que os pássaros cantam: os pássaros cantam por função biológica. Nós escrevemos por opção. Mas o problema comigo é que nunca fiz essa opção. Não acordei um dia e disse, muito bem, acho que vou ali ser escritora. Eu escrevo histórias curtas, médias e longas e poemas em prosa e em verso praticamente desde que aprendi a escrever. No meu primeiro conto nevava na Baixada Fluminense, mas eu não tinha nenhuma intenção por trás da neve. Apenas nevava na Baixada Fluminense.
Tantas vezes neva-na-Baixada-Fluminense nos meus livros e eu não sei dizer por quê. Apenas neva. Eu não tenho um manifesto, não defendo uma determinada postura, não sou favorável nem desfavorável à literatura “fácil” ou “difícil”. Não tenho um projeto literário, não bolei uma trajetória para mim mesma e nem sei se estarei escrevendo daqui a dez anos (embora exista uma grande chance de que venha a estar, somente porque escrevo há mais de trinta).
Então, por quê? Não é para mudar o mundo. Não é para Demonstrar, Provar, Denunciar, Divertir, Ensinar, não sei nem mesmo se é para Sugerir. Talvez essa seja uma daquelas perguntas sem resposta que a cada vez que é feita revela com mais minúcia a sua condição de sem resposta. Quando me deparo com ela, então, acabo respondendo: é porque gosto.
Contudo, nem sempre eu gosto, nem sempre é fácil, nem sempre é pura alegria em prata e branco. Podemos racionalizar as respostas, espremer a lógica até produzir um suco de cor e sabor agradáveis, mas não acredito que haja uma resposta lógica a esse por-que-escrever. Então, na falta dessa resposta, dizer que é porque gosto me parece a coisa menos distante da verdade – e pelo menos não é uma justificativa pomposa, grandiloquente, ambiciosa. Não é para nada. É pela coisa em si. Escrever é para e por escrever.
Com isso, sei que estou acrescentando mais ruído ao ruído do mundo, algo que o André tão bem me recordou ontem, sem querer. Então acho que é preciso o contrário do ego, o contrário do umbigo, o contrário do olha-só-a-minha-foto-na-revista, a menor valorização possível da minha relevância como escritora. Se o que eu escrevo, o meu ruído, tiver alguma graça para alguém, isso sempre será consequência – será sempre inesperado e imponderável .E eu escrevo, só isso. E por enquanto.
Adriana escreve o blog Caquis Caídos.
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